Por: Aline Cardoso
Entre irmãos sempre existe um laço invisível, mas para João Fernando da Luz, de 66 anos, atual presidente da estiva, esse laço ganhou um significado ainda mais profundo quando precisou tomar uma das decisões mais importantes da sua vida: doar medula óssea para o irmão mais velho, José Hermínio da Luz, de 68 anos.
A história aconteceu em Paranaguá, mas poderia emocionar qualquer pessoa. José, trabalhador portuário aposentado, começou a apresentar sinais que ele mesmo ignorava: sangramento pela boca e nariz, travesseiro manchado de sangue, perda de peso rápida. A família notou primeiro e insistiu para que ele fosse ao médico. Quando finalmente aceitou ser levado ao Hospital Erasto Gaertner, em Curitiba, a notícia foi devastadora: leucemia. A medula dele havia parado de produzir sangue.
José estava literalmente lutando pela vida. Cada semana, bolsas de sangue eram necessárias para mantê-lo vivo até que um doador de medula compatível fosse encontrado. E o doador estava bem ao lado dele: o irmão.
“Eles falaram que, pelo meu estado de saúde, eu poderia doar, mesmo com 66 anos. Era a única chance do meu irmão. Eu não podia negar”, conta João.
O processo não foi fácil. João precisou colocar um cateter, tomar injeções para estimular a medula e passar pelo procedimento delicado de coleta. “A esposa dele começou a avisar que todo dia de manhã o travesseiro da cama estava ensanguentado”, recorda.

No hospital, João descobriu que era considerado um “herói” por muitos pacientes. “O pessoal do banco de sangue vinha conversar, tirar foto, agradecer… eu não fiz nada demais, só fiz o que qualquer pessoa deveria fazer: salvar uma vida”, diz com simplicidade.
Hoje, José segue em recuperação no isolamento do hospital, sem poder receber visitas diretas, apenas vendo a família pelo vidro. Mas já demonstra sinais de melhora, mais corado, mais forte. “Ainda é cedo, os médicos disseram que o corpo leva até 20 dias para reagir, mas nós estamos confiantes”, diz João.
E ele deixa um recado claro: “Quem puder doar sangue, medula, que doe. Meu irmão só está vivo porque muita gente doou sangue para ele toda semana. E a medula foi o que deu a ele uma nova chance.”
⚓ Superação também no trabalho: João fala sobre a luta para reerguer o sindicato da estiva
Mas a luta de João Fernando da Luz não se resume à doação de medula. Ele também enfrentou uma verdadeira batalha para recuperar o Sindicato dos Estivadores de Paranaguá, entidade que ele preside desde 2022.
Quando assumiu o comando da Estiva, o sindicato estava afundado em dívidas, sem dinheiro nem para pagar luz, água ou manter o transporte de trabalhadores doentes que precisavam ir para Curitiba. “Teve mês que paguei conta do meu bolso para manter o sindicato funcionando”, revela.
Com apoio da nova diretoria, João ajudou a renegociar dívidas, devolveu R$ 2 milhões cobrados indevidamente de associados e colocou as contas em dia, mesmo sem receber salário durante mais de um ano. “A gente trabalha porque acredita na categoria, porque sabe que o sindicato salva vidas também, especialmente de quem precisa fazer tratamento”, afirma.
Hoje, ele disputa a reeleição e garante que a prioridade é manter o sindicato limpo, transparente e com foco nos direitos dos trabalhadores. “O dinheiro do sindicato é do trabalhador, não é nosso. Cada centavo é fiscalizado e toda despesa tem que passar pelo conselho fiscal. Esse é o nosso compromisso.”
Entre a vida do irmão e a vida profissional, João tem uma certeza: “Vale a pena lutar pelas pessoas. Pela nossa família, pelos nossos companheiros de trabalho. Se eu tivesse que fazer tudo de novo, faria.”
